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uma etnografia do processo de “pacificação” de favelas cariocas

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Entre o fogo cruzado e o campo minado:

Valle Menezes, P.

2015

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Valle Menezes, P. (2015). Entre o fogo cruzado e o campo minado: uma etnografia do processo de pacificacao de favelas cariocas. Vrije Universiteit.

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Palloma Valle Menezes

ENTRE O “FOGO CRUZADO” E O “CAMPO MINADO”

uma etnografia do processo de “pacificação” de favelas cariocas

(3)

Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), no Brasil, e a Vrije Universiteit Amsterdam (VU Amsterdam), na Holanda. Este doutorado foi realizado no âmbito do Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP/UERJ), sob a orientação do Professor Luiz Antonio Machado da Silva, e do Departamento de Antropologia Social e Cultural (VU Amsterdam), sob a orientação do Professor Kees Koonings e da Professora Marjo de Theije.

Banca Examinadora:

Profa. Dra. Fiona Macaulay (University of Bradford)

Prof. Dr. Mattijs van de Port (Vrije Universiteit Amsterdam) Prof. Dr Michiel Baud (Universiteit van Amsterdam)

Prof. Dr Martijn Koster (Universiteit Utrecht) Prof. Dr Martijn Oosterbaan (Universiteit Utrecht)

_____________________________________________________________________

Menezes. Palloma Valle.

Entre o “fogo cruzado” e o “campo minado”: uma etnografia do processo de

“pacificação” de favelas cariocas/ Palloma Valle Menezes. Amsterdam, 2015.

1. Sociologia. 2. Sociologia Urbana. 3. Antropologia. 4. Antropologia Urbana

ISBN: 978-94-6299-159-0

Capa (Cover Design): Nikki Vermeulen

Fotografia da Capa (Cover Photo): Carlos Coutinho

Impresso por (Printed by): Ridderprint BV, Ridderkerk, the Netherlands.

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VRIJE UNIVERSITEIT

Entre o “fogo cruzado” e o “campo minado”:

uma etnografia do processo de “pacificação” de favelas cariocas

ACADEMISCH PROEFSCHRIFT ter verkrijging van de graad Doctor aan

de Vrije Universiteit Amsterdam, op gezag van de rector magnificus prof.dr. F.A. van der Duyn Schouten,

in het openbaar te verdedigen ten overstaan van de promotiecommissie van de Faculteit der Sociale Wetenschappen op maandag 21 september 2015 om 13.45 uur

in de aula van de universiteit, De Boelelaan 1105

door

Palloma Valle Menezes geboren te Rio de Janeiro, Brazilië

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ethnography of the "pacification" process of Rio de Janeiro's favelas. 2015.

At the end of 2008, a new form of policing in Rio de Janeiro favelas profoundly changed the routine and sociability of its residents. This mode of policing was called Pacifying Police Unit (Unidade de Polícia Pacificadora, UPP). The main objective of this dissertation is to analyze this project’s impacts on and consequences for the lives of residents of "pacified" territories. Based on more than four years of ethnographic fieldwork in the first two "pacified" favelas, namely Santa Marta and Cidade de Deus (City of God), I take the UPP as a problematic object that is constantly inquired by those who have been directly affected by it. The dissertation is, in this sense, a study that focuses on the inquiries of those who lived the UPP as a problem. In conclusion, I argue that one of the main consequences of the UPP implementation was a change in the phenomenology of inhabiting the favela, a change that occurred mainly through the emergence of what I call a "minefield" regime. I argue that the environment of these favelas after "pacification" began to be characterized by the coexistence with intensive fluctuations and creative arrangements between the old logic of the

"crossfire", based on the constant fear of shootouts, and the logic of the "minefield", based on a constant monitoring of the environment and fear of possible

"contamination" generated by the contact between residents, police and drug traffickers who now share the same territory 24 hours a day.

Keywords: violence, drug traffic, pacification, favelas, Rio de Janeiro.

(7)

het proces van "pacificatie" van Rio's favelas. 2015.

In het najaar van 2008 heeft een nieuwe werkwijze van de politie in de sloppenwijken het dagelijks leven en sociabiliteit van de inwoners ingrijpend veranderd. Deze politie aanpak heette Unidade de Polícia Pacificadora (UPP). De belangrijkste doelstelling van dit proefschrift is om de effecten en de gevolgen die dit project heeft gehad op het leven van de bewoners van deze "gepacificeerde" gebieden te analyseren. Op basis van bijna vier jaar veldwerk in de eerste "gepacificeerde" favela’s, namelijk Santa Marta en Cidade de Deus, neem ik de UPP als een problematisch object dat permanent wordt onderzocht door degenen die er rechtstreeks door getroffen zijn. Dit proefschrift is daardoor een onderzoek dat zich richt op degenen die de UPP als een probleem hebben ervaren. Als conclusie stel ik dat een van de belangrijkste effecten van de uitvoering van de UPP een verandering was in de fenomenologie van het bewonen van de sloppenwijken, een verandering die voornamelijk heeft plaatsgevonden door de opkomst van wat ik het "mijnenveld" regime noem. Vanuit dit perspectief stel ik voor dat de leefomgeving van deze favela’s na de "pacificatie"

wordt gekenmerkt door het samenleven van bewoners, politie en mensenhandelaars die nu 24 uur per dag hetzelfde gebied delen. Daardoor ontstaan intensieve fluctuaties en creatieve arrangementen, tussen de oude logica van "crossfire", op basis van de voortdurende angst van schietpartijen, en de logica van het "mijnenveld", gebaseerd op constante monitoring van de omgeving en de angst voor mogelijke "besmetting", gegenereerd door het contact.

Trefwoorden: geweld, drugshandel, vrede, favela, Rio de Janeiro.

(8)

INTRODUÇÃO 11

1.“ENTRANDO EM UM GRANDE TÚNEL ESCURO” 11

2.AS ROTINAS, OS TIROTEIOS E A LEITURA DO CLIMA DAS FAVELAS 14

3.AUPP COMO OBJETO DE INVESTIGAÇÃO DE DIVERSOS ATORES 22

4.CAMINHOS E DILEMAS DO CAMPO 26

5.INVESTIGANDO OS PROCESSOS DE INVESTIGAÇÃO DA UPP: ROTEIRO DA TESE 37

I. DA INDETERMINAÇÃO À PROBLEMATIZAÇÃO 47

1.DOPONTODEVISTADOS“INVASORES” 49

1.1.A VIOLÊNCIA URBANA COMO UM PROBLEMA SEM SOLUÇÃO” 49 1.2.SANTA MARTA: QUANDO A FAVELA TORNA-SE UM LABORATÓRIO” 53 1.3.CIDADE DE DEUS:“LABORATÓRIO PARA PACIFICAÇÃO EM ÁREAS EXTENSAS 61 1.4.A EXPERIMENTAÇÃO DO PROJETO E A CRIAÇÃO DA MARCA UPP 66 1.5.OS CAMINHOS DA PACIFICAÇÃO E A FORMAÇÃO DO CONSENSO EM TORNO DAS UPPS 77

2.DOPONTODEVISTADOS“INVADIDOS” 83

2.1.MAIS UMA OPERAÇÃO POLICIAL NORMAL”? 83

2.2.A INAUGURAÇÃO DA UPP E O SURGIMENTO DE UMA NUVEM DE ESPECULAÇÃO” 86 2.3.OS RUMORES COMO UM MECANISMO DE INVESTIGAÇÃO COLETIVA 88

2.4.MAPEAMENTO DOS RUMORES DA PACIFICAÇÃO” 94

2.5.RUMORES COMO SÍNTESES DAS MUDANÇAS DOS PROBLEMAS PÚBLICOS NAS FAVELAS 103

II – DA PROBLEMATIZAÇÃO AOS TESTES 107

3.ENTREORDENAMENTOSERESISTÊNCIAS 109

3.1.NOVAS REGRAS E SEUS IMPACTOS NA ROTINA DAS FAVELAS PACIFICADAS” 109 3.2.A INSTALAÇÃO DE CÂMERAS E O “BIG BROTHER SANTA MARTA” 113 3.3.“DURAS CONSTANTES E O LANÇAMENTO DA CARTILHA DE ABORDAGEM POLICIAL 125 3.4.O CONTROLE DA VIDA CULTURAL NA FAVELA E A CRIAÇÃO DA RÁDIO SANTA MARTA 133 3.5.A REGULAÇÃO DOS SERVIÇOS E ALGUMAS TRANSFORMAÇÕES NA POLÍTICA NA FAVELA 143 4.OPROBLEMADAAPROXIMAÇÃONO“POLICIAMENTODEPROXIMIDADE” 159

4.1.OS TRAUMAS DO PASSADO 159

4.2.MEDOS RELACIONADOS AO FUTURO DA UPP 162

4.3.AS FERRAMENTAS DE APROXIMAÇÃO UTILIZADAS EM ÁREAS PACIFICADAS” 168 4.4.“ESSE É O BONDE DA PRISCILLA SE NÃO QUER, ENTÃO, REJEITA.UH, ACEITA!” 176 4.5.“ELA É MÃEZONA, MAS QUANDO É NECESSÁRIO, BATE FEITO HOMEM” 181

III. DOS TESTES À ESTABILIZAÇÃO 189

5.MONITORAMENTOECONTAMINAÇÃO 191

5.1.“NA FAVELA, TÁ TUDO MONITORADO” 191

5.2.“AGORA É GATO E RATO” 197

5.3.O PERIGO DA CONTAMINAÇÃO” 205

5.4.EVITANDO FALAR SOBRE E COM POLICIAIS E TRAFICANTES 211

5.5.QUANDO O CONTATO É INEVITÁVEL: COMO TENTAR NÃO SE CONTAMINAR? 216

6.MAPEAMENTOEROTINIZAÇÃO 229

6.1.“EDUCANDO A ATENÇÃO PARA NAVEGAR NO NOVO AMBIENTE DA FAVELA 229

6.2.POLICIAIS MAPEIAM MORADORES E TRAFICANTES 231

6.3.MORADORES MAPEIAM POLICIAIS E TRAFICANTES 247

6.4.TRAFICANTES MAPEIAM POLICIAIS E MORADORES 257

6.5.A ROTINIZAÇÃO E A ACOMODAÇÃO TEMPORÁRIA DOS CONFLITOS 262

(9)

7.2.PERCEPÇÕES SOBRE A UPPSOCIAL E OS TERRITÓRIOS DA PAZ 269 7.3.“SERÁ QUE AINDA ESTAREMOS AQUI QUANDO AS OLIMPÍADAS CHEGAREM?” 272 7.4.A“INVASÃO DE TURISTAS EM FAVELAS PACIFICADAS” 277

7.5.QUANDO O MERCADO INVADE A FAVELA 281

8.NOVASINSEGURANÇASEM“TEMPOSDEPAZ” 291

8.1.“TEM UM TARADO RONDANDO NA FAVELA” 291

8.2.DIFERENTES VERSÕES PARA EXPLICAR O SUMIÇO DO TARADO” 295

8.3.“ESTÃO ROUBANDO ATÉ CUECA DO VARAL” 301

8.4.DA ANOMALIA À ESTATÍSTICA 306

8.5.“AUPP SERVE PARA QUE, SE AGORA ESTÁ TENDO ESTUPRO E ROUBO NA FAVELA?” 310 V. DAS NOVAS INDETERMINAÇÕES ÀS NOVAS INVESTIGAÇÕES 317 9.O(RE)TENSIONAMENTODOCLIMANASFAVELAS“PACIFICADAS” 319

9.1.A PRESENÇA AUSENTE DA MILÍCIA EM FAVELAS COM UPP 319

9.2.O(RE)FORTALECIMENTO DO TRÁFICO 329

9.3.A VOLTA DA CORRUPÇÃO POLICIAL 335

9.4.A“CRISE DAS UPPS 340

9.5.“ESTÁ TUDO VOLTANDO A SER COMO ANTES” 345

10.SOCIOLOGIADACRÍTICAÀSUPPS 353

10.1.O DESARMAMENTO DA CRÍTICA E DO TRÁFICO EM ÁREAS PACIFICADAS” 353

10.2.O CONSENSO EM TORNO DAS UPPS 356

10.3.O SILENCIAMENTO DA CRÍTICA AO PROJETO 360

10.4.O REARMAMENTO DA CRÍTICA E DO TRÁFICO 368

10.5.O FIM DO CONSENSO E A POLARIZAÇÃO DA CRÍTICA ÀS UPPS 376

CONSIDERAÇÕES FINAIS 391

1.AS MÚLTIPLAS CAMADAS DE VIGILÂNCIA QUE SE SOBREPÕEM NAS FAVELAS PACIFICADAS” 391 2.A CONTINUIDADE DA EXPERIÊNCIA DE VIDA SOB CERCO PÓS-“PACIFICAÇÃO” 394 3.DO TÁ TUDO DOMINADO AO TÁ TUDO MONITORADO” 396

4.O REGIME DE CAMPO MINADO” 400

5.ENTRE O FOGO CRUZADO E O CAMPO MINADO” 404

REFERÊNCIAS 409

ANEXOS 425

(10)

INTRODUTION 11

1."ENTERINGALONGANDDARKTUNNEL” 11

2.ROUTINE,SHOOTINGSANDTHEFAVELA“MEASUREMENTSOFCLIMATE" 14 3.THEUPPASOBJECTOFINQUIRYOFDIFFERENTACTORS 22

4.FIELDWORKPATHSANDDILEMMAS 26

5.INQUIRINGTHEUPP'S“INQUIRYPROCESSES”:DISSERTATIONROADMAP 37

I. FROM INDETERMINATION TO PROBLEMATIZATION 47

1.FROMTHEPOINTOFVIEWOFTHE“INVADERS” 49

1.1.URBANVIOLENCEAS"APROBLEMWITHOUTSOLUTION" 49 1.2.SANTAMARTA:WHENTHEFAVELABECOMESA "LABORATORY" 53 1.3.CITYOFGOD:"LABORATORY"FOR“PACIFICATION”INLARGEAREAS 61 1.4.APROJECTTRIALANDTHECREATIONOFTHEUPPBRAND 66 1.5.PATHSOF"PACIFICATION"ANDCONSENSUSFORMATIONAROUNDUPPS 77 2.FROMTHEPOINTOFVIEWOFTHE“INVADED" 83 2.1.ONEMORE"NORMALPOLICEOPERATION"? 83 2.2.THEARRIVALOFUPPANDTHEEMERGENCEOFA"CLOUDOF

SPECULATIONS" 86

2.3.RUMORSASACOLLECTIVEINQUIRYTOOL 88

2.4.MAPPINGRUMORS.OF“PACIFICATION’ 94

2.5.RUMORSASSYNTHESISOFSHIFTSINPUBLICPROBLEMSINTHEFAVELA 103

II – FROM PROBLEMATIZATION TO TESTS 107

3.BETWEENORDERANDRESISTANCE 109

3.1.NEWRULESANDITSIMPACTSONTHEROUTINESOF"PACIFIED"FAVELAS 109 3.2.THEINSTALLATIONOFCAMERASAND"BIGBROTHERSANTAMARTA" 113 3.3.CONSTANTSTOP-AND-FRISKSANDTHELAUNCHOFAGUIDETODEALING

WITHTHEPOLICE 125

3.4.THECONTROLOFCULTURALLIFEINTHEFAVELAANDTHE

ESTABLISHMENTOFTHESANTAMARTARADIOSTATION 133 3.5.REGULARIZATIONOFSERVICESANDSOMESHIFTSINPOLICYINTHE

FAVELA 143

4.THEPROBLEMOFRAPPROACHMENTIN"PROXIMITYPOLICING" 159

4.1.TRAUMASOFTHEPAST 159

4.2.FEARSRELATEDTOTHEFUTUREOFTHEUPP 162

4.3.“TOOLSOFRAPPROACHMENT”USEDIN“PACIFIED”AREAS 168 4.4.“THISISPRISCILLA’SGANG,IFYOUDON’TWANTIT,THENREJECTIT!

[OH,]ACCEPTIT!” 176

4.5.“SHE’SASUPERMOM,BUTWHENNEEDBE,SHEHITSLIKEAMAN” 181

III. FROM TESTS TO STABILITILY 189

5. MONITORINGANDCONTAMINATION 191

5.1."THEFAVELAISUNDERINTENSIVESURVEILLANCE" 191 5.2."NOWITISACAT-AND-MOUSEGAME" 197

5.3.THEDANGEROF"CONTAMINATION" 205

5.4.AVOIDINGTALKABOUTANDTALKWITHPOLICEANDDRUGDEALERS 211 5.5.WHENCONTACTISINEVITABLE:HOWTOPREVENTCONTAMINATION? 215

 

(11)

6.2.COPSMAPRESIDENTSANDDEALERS 231

6.3.RESIDENTSMAPCOPSANDDEALERS 247

6.4.DEALERSMAPCOPSANDRESIDENTS 257

6.5.THEROUTINIZATIONANDTHETEMPORARYACCOMMODATIONOF

CONFLICTS 262

IV. FROM STABILITY TO NEW FORMS OF INDETERMINATION 265

7. OPPORTUNITIESANDCONCERNSAFTERUPP 267

7.1."WEDONOTWANTTOTALKABOUTTHEPOLICE...WEWANTTOCHANGE

OURFOCUS" 267

7.2.PERCEPTIONSOF"UPPSOCIAL"AND"TERRITÓRIOSDAPAZ" 269 7.3.WILLWEWILLBEHEREWHENTHEOLYMPICGAMESHAPPEN? 272 7.4.THE"INVASION"TOURISTSIN"PACIFIED"FAVELAS 277 7.5.WHENTHEMARKET"INVADES"THEFAVELA 281 8.NEWINSECURITIESIN"TIMESOFPEACE" 291 8.1."THEREISAPERVERTPROWLINGTHEFAVELA" 291 8.2.DIFFERENTVERSIONSTOEXPLAINTHEPERVERT'SDISAPPEARANCE" 295 8.3.“PEOPLEAREEVENSTEALINGUNDERWEAROFFCLOTHESLINES” 301

8.4.FROMANOMALYTOSTATISTICS 306

8.5."WHAT'STHEUSEOFTHEUPPIFRAPEANDROBBERIESAREHAPPENING

INTHEFAVELA”? 310

V. FROM NEW FORMS OF INDETERMINATION TO NEW INQUIRIES 317 9.THE(RE)STRENGTHENINGOFTHE"PACIFIED"FAVELACLIMATE 319 9.1.THE[ABSENT]PRESENCEOFMILITIASIN"PACIFIED"FAVELAS 319 9.2.THE(RE)STRENGTHENINGOFDRUGTRAFFICKING 329

9.3.THERETURNOFPOLICECORRUPTION 335

9.4.THE"CRISIS"OF THEUPPS 340

9.5."EVERYTHINGISGOINGBACKTOHOWITUSEDTOBE" 345

10.ASOCIOLOGYOFCRITICISMREGARDINGUPPS 353

10.1.DISARMAMENTOFCRITICISMANDDRUGTRAFFICKINGIN“PACIFIED”

AREAS 353

10.2.THECONSENSUSAROUNDUPPS 356

10.3.SILENCINGCRITICISMREGARDINGUPP 360

10.4.THEREARMAMENTOFCRITICISMANDDRUGTRAFFICKING 368 10.5.THEENDOFCONSENSUSANDTHEPOLARIZATIONOFCRITICISM

REGARDINGUPP 376

CONCLUSIONS 391

1.MULTIPLELAYERSOFSURVEILLANCEIN"PACIFIED"FAVELAS 391 2.THECONTINUITYOFTHE"LIFEUNDERSIEGE"EXPERIENCEAFTER

"PACIFICATION" 394 3.FROM"EVERYTHINGISDOMINATED"TO"EVERYTHINGISMONITORED" 396

4.THE"MINEFIELD"REGIME 400

5.BETWEENTHE"CROSSFIRE"ANDTHE"MINEFIELD" 404

 

REFERENCES 409 APPENDIX 425

(12)

Aos meus pais, Yanne e Diogo.

A três famílias que admiro muito e que fizeram eu me sentir em casa no Santa Marta e

na Cidade de Deus: a de Dona Francisca, a de Zé Baixinho e a de Gilcinei.

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(14)

AGRADECIMENTOS

Em primeiro lugar, eu gostaria de agradecer aos meus orientadores. Luiz Antonio Machado da Silva, desde o mestrado, sempre me apoiou, acreditou no meu trabalho e me deu a liberdade que eu precisava para a realização desta tese. Admiro muito a força e o entusiasmo de Machado e sou muito grata por tudo que aprendi com ele ao longo dos últimos oito anos. Desejo vida longa à nossa interlocução.

Sou muito grata à Marjo por ter viabilizado minha ida à Vrije Universiteit (VU) Amsterdam durante o doutorado sanduíche, por ter me recepcionado com tanta atenção e carinho e ainda por ter me convidado a fazer uma co-tutela (ou doutorado duplo) entre a UERJ e a VU. Marjo desde 2011 acompanha de perto a produção dessa tese, assim como Kees Koonings, que ajudou muitíssimo no desenvolvimento dos argumentos que apresento nesse trabalho. Agradeço aos dois pelas diversas reuniões que tivemos em Amsterdam, em Bogotá, no Rio e via Skype.

Queria agradecer também à Bianca Freire-Medeiros por ser minha maior incentivadora, parceira e interlocutora na academia. Foi por “culpa” dela que me apaixonei por fazer trabalho de campo e resolvi dedicar-me integralmente às ciências sociais. Bianca sempre me inspira a ser uma socióloga mais competente e uma pessoa melhor. Os alunos da USP têm muita sorte por contar com ela como professora agora.

Agradeço muitíssimo à professora Patrícia Birman (que tanto admiro), à professora Marcia Leite (que é uma referência importante para o meu trabalho) e aos professores Gabriel Feltran e Michel Misse por, gentilmente, aceitarem compor a banca da minha defesa de tese no Rio de Janeiro. Agradeço ao professor Adalberto Cardoso e à professora Mariana Cavalcanti, que aceitaram ser suplentes da banca da UERJ. Gostaria também de agradecer à professora Fiona Macaulaye e aos professores Mattijs van de Port, Michiel Baud, Martijn Koster e Martijn Oosterbaan por aceitarem compor a banca da minha defesa de tese em Amsterdam.

Expresso meus agradecimentos a CAPES e a FAPERJ que financiaram esta

pesquisa em diferentes momentos, bem como ao CNPq, que me concedeu um ano de

bolsa sanduíche. Assim como ao Drugs, Security and Democracy (DSD) Program, ao

Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales (CLACSO) e à Foundation for Urban

and Regional Studies (FURS), que financiaram diferentes partes da minha pesquisa de

doutorado.

(15)

Agradeço ao Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e ao Department of Social and Cultural Anthropology da Vrije Universiteit Amsterdam, que me propiciaram excelentes condições de trabalho para o desenvolvimento da tese. Não poderia deixar de agradecer à Annet, que tanto me ajudou na VU, e a todos os funcionários do IESP, que sempre foram muito solícitos e carinhosos comigo. Agradeço muitíssimo à Claudia Boccia por ter feito a revisão dessa tese. Guardo enorme carinho por Florita, Bia, Angela, Lia, Simone, Paulinha, Romário, Lula, Ricardinho, Márcio, Renato, e, em especial, Cristiana e Carol – de quem tanto sinto falta.

Essa tese é resultado de muitas trocas. Sou imensamente grata aos moradores do Santa Marta e da Cidade de Deus que se dispuseram a dividir suas histórias de vida comigo. Agradeço especialmente à família da Natalia Urbina, que me alugou um quarto no primeiro mês que morei no Santa Marta; à Dona Francisca, que me acolheu como uma filha em sua casa e tornou-se um exemplo de garra para mim; à Simone, com quem tive o privilégio de conviver de perto por muitos meses e que hoje se tornou uma grande amiga; à Juliana, que também me acolheu sempre com um lindo sorriso no rosto; ao Zé Baixinho, à Dona Laura, à Márcia, ao Mário, ao Marcelo, à Marcelinha, ao Guilherme e à Sofia, que formam uma família que muito admiro. Sou muito grata por todo o acolhimento que eles sempre me oferecem.

Queria agradecer também ao rapper Fiell, que confiou em mim e me abriu tantas portas na favela. Sou especialmente grata ao Fiell e à Natália pela oportunidade de ter participado da Rádio Santa Marta. Agradeço a todos companheiros de Rádio por tudo que me ensinaram. Acompanhar diariamente o funcionamento da rádio foi uma das experiências mais interessantes e prazerosas que tive em campo.

Sou grata também ao Itamar Silva, liderança tão importante dentro e fora do Santa Marta, por todas as reuniões e eventos que tive a oportunidade de participar no Grupo Eco. Agradeço também ao Juan e, especialmente, à Dorlene por sempre me receberem com carinho no Eco. Fico muito feliz de saber que, em breve, Dornele será minha colega de profissão. Sabemos que a academia precisa de mulheres competentes, inteligentes e engajadas como ela, que contribuirão para a redução das enormes desigualdades que ainda existem nesse país.

Agradeço à Sheila por toda interlocução, por tudo que aprendi e sempre

continuo aprendendo com ela que é turismóloga, guia, liderança, mãe, mulher e um

exemplo para mim. Admiro muito também Vitor Lira e desejo que ele e outros

(16)

moradores do Pico do Santa Marta consigam permanecer no alto do morro onde teve início a história da favela. Como Vitor sempre defende, a luta do Pico deveria ser uma luta não só dos moradores daquela área que corre o risco de ser removida pelo Governo do Estado, mas de todo o Santa Marta e de toda a cidade do Rio de Janeiro.

Agradeço aos outros membros do Comitê de Turismo que sempre me ajudaram muito em minha pesquisa: Gilson, Thiago, Salete e Verônica. E agradeço ainda ao Zé Mário por ter conversado comigo tantas vezes ao longo do trabalho de campo. As várias entrevistas que fiz com ele, em diferentes momentos da pesquisa, foram fundamentais para o desenvolvimento dessa tese.

Na Cidade de Deus tive, a honra de ser acolhida pela família de Gilcinei.

Agradeço ao Gil por tudo que fez por Diogo e por mim ao longo dos últimos anos.

Agradeço também ao amigo Jonathan, por aceitar conversar comigo tantas vezes de forma tão sincera e aberta. E também aos queridos Wallace, Lidiane, Rômulo, Messias, Carlinhos, Beto e Ginha.

Agradeço aos policiais que se dispuseram a conversar comigo tanto no Santa Marta, como na Cidade de Deus e no Parque Proletário. E não posso deixar de expressar a minha enorme gratidão aos jovens envolvidos com tráfico, cujos nomes não posso revelar, que aceitaram ser entrevistados e me contar suas histórias de vida.

Não podia deixar de agradecer ao Carlos Coutinho por ter autorizado que eu usasse a incrível fotografia que estampa a capa deste trabalho. Desejo que esse talentoso fotográfo continue usando sua câmera fotográfica como arma para fazer política dentro e fora da favela.

Além das trocas feitas durante o trabalho de campo, eu não poderia deixar de destacar a enorme importância da interlocução com outros pesquisadores que vêm contribuindo para enriquecer o campo de estudos em que me encontro inserida.

Agradeço a todos os colegas do CEVIS: Luisinho, Marcia, Machado, Lia, Mariana, Christina, Jussara, Wania, Cesar, Fabio, Carla, Juliana, Dinaldo, Claudia, Marcella, Monique, Bruno, Frank e Wellington. As reuniões semanais do CEVIS foram essenciais para a minha formação ao longo dos últimos anos e foram importantíssimas para o desenvolvimento dessa tese.

Agradeço à professora Licia Valladares, que é uma importante referência para

mim, pela oportunidade de trabalhar no Urbandata. Sou muito grata às queridas

colegas com quem muito aprendi neste trabalho: Lidia Medeiros, Filippina Chinelli,

Claudia Cruz, Raíza Siqueira e Joice Campos. Gostaria de agradecer ainda ao

(17)

competentíssimo Alexandre Magalhães, com quem fiz graduação, mestrado, doutorado, trabalhei no Urbandata e espero ter a oportunidade de voltar a trabalhar junto em um futuro próximo.

Agradeço ao Professor Ricardo Benzaquen de Araújo e a todos colegas de turma pelas contribuições dada para que eu começasse a desenhar minha pesquisa durante o Seminário de Projeto de Tese que fiz em 2009. Sou muito grata ao professor Adalberto Cardoso e às professoras Marcia Leite e Bianca Freire-Medeiros por todas as contribuições que deram durante a qualificação dessa tese; posteriormente, José Maurício Domingues e todos colegas que fizeram Seminário de Tese comigo por contribuírem debatendo alguns capítulos deste trabalho.

No início do doutorado, Machado fez reuniões com todos os seus orientandos, que foram muito proveitosas para mim. Agradeço aos colegas Rodrigo de Castro, Alexis Cortés, Marília Silva e Roberta Pedrinha, que dividiram esse momento comigo.

No fim do ano passado, Machado voltou a organizar essas reuniões, dessa vez, junto com os orientandos de Mariana Cavalcanti e integrantes do Laboratório de Estudos Urbanos (LEU) da Fundação Getúlio Vargas. Sou muito grata por ter tido a oportunidade de apresentar no grupo uma versão quase final dessa tese. As contribuições de Machado, Mariana, Marcella Carvalho, Bruno Coutinho e de todos os outros presentes foram muito importantes no momento de finalização desse trabalho. Agradeço também ao Alexandre Werneck pelas referências  goffmanianas.

Agradeço ao Marcio Grijó pela pesquisa realizada junto com Bianca sobre turismo nas favelas “pacificadas”; à Diana Lima, à Wania Mesquita, à Fátima Cecchetto e à Juliana Corrêa pelas conversas sobre o impacto das UPPs na vida dos jovens do Santa Marta e do Complexo do Alemão; ao Rafael Soares Gonçalves por ter me convidado a debater essa tese no LEUS; ao querido Nicolas Bautès e à Marie Morelle por terem me convidado para participar das jornadas de estudo "Ville et informalité politique au Brésil " em maio de 2014, em Paris. Agradeço a todos que participaram das jornadas e, em especial, aos comentários de Géraldine Bugnon (que foi minha debatedora) e de Caterine Reginensi. Sou grata também pelos comentários de Gabriel Feltran e Carolina Grillo, que já eram importantes referências bibliográficas para mim, mas que tive o grande prazer de conhecer em Paris.

Agradeço à querida Taniele Rui que conheci no México e me encantei por seu

talento e carisma; à Fraya Frehse e à Julia O'Donnell pelas contribuições que deram

ao meu trabalho no úlimo encontro da Anpocs. Queria agradecer à Lia Rocha pela

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oportunidade de apresentar meu trabalho no Cidades. Foi muito importante para mim apresentar alguns capítulos dessa tese nesse grupo que reúne tantos pesquisadores talentosos. Agradeço especialmente ao Frank Davies, à Monique Carvalho, à Sara Koenders e à Marcia Leite pelo incrível debate que tivemos sobre as UPPs em dezembro de 2014 na UERJ. E também à queridíssima e super competente Carla Mattos que participou desse debate e, como sempre, me deu excelentes ideias que foram incorporadas à essa tese.

Agradeço a pessoas queridas que tive a oportunidade de conhecer entre o mestrado e doutorado: ao admirável Carlos Pinho, ao divertido Thiago Nasser, ao querido Tomas e ao saudoso amigo Fernando Randau. Sem falar nas meninas do meu coração que o IUPERJ me deu e que nunca mais vou largar: Kelly Pedroza, Juliana Baghdadi, Juliana Candian e também Laura e Dora que fazem nossos “muros” serem menos de lamentação e mais de celebração.

Agradeço ainda aos amigos da UERJ que tanto admiro e quero sempre ter por perto. À Mayra e ao Paulo Victor, que sinto tanta falta no meu dia a dia. À Rachel Barros, pela visita em Amsterdam que nunca vou esquecer e por fazer eu sempre me sentir tão bem quando ela está por perto. À Juliana Farias, por ser um exemplo para todos nós e uma festa em pessoa. À belíssima Fabiene Gama, pelo iluminado e lindo apartamento que me passou em Paris e por fazer parte da minha vida apesar da distância. Ao Cesar Teixeira, amigo que desde a graduação admiro profundamente e com quem sei que sempre posso contar.

Sou grata ainda às alegrias e aos amigos que Amsterdam me deu: Fabio, que se tornou um irmão do coração para mim; Tiago e Yaron, que sempre me acolheram com tanto amor e ainda me emprestaram a linda casa deles na Holanda, Stella, Letícia e Karina, com quem compartilhei tantas descobertas e alegrias; mais uma vez Sara, a holandesa mais brasileira que já conheci, sempre tão carinhosa e parceira; linda Maja, com quem dividi sala, dúvidas, experiências e risadas; Joan, pelas visitas a nossa sala que sempre alegravam nossos dias de trabalho na VU; Maaike Matelski, que teve confiança para me deixar cuidar de sua casa e de seus gatos.

Agradeço às meninas queridas que tive a sorte de conhecer através de Bianca.

Tenho orgulho de dizer que depois de quase dez anos de convivência, Alyssa Medeiros se tornou uma amiga que admiro muito e que quero ter por perto a vida toda.

Fernanda Nunes que, além de competente colega de trabalho, também é uma amiga

querida para mim. Queria agradecer à Fernanda e também à Gabriela pelo carinho de

(19)

sempre e por terem me ajudado muitíssimo nas transcrições das muitas entrevistas que fiz ao longo dos últimos anos.

Não poderia deixar de agradecer também à minha talentosa amiga Clarissa; à Poliana, que desde a infância faz parte da família; à minha afilhada Kiane, que tanto me dá orgulho; às amadas primas Mônica e Mirella, aos primos Mauro, Maurício, Luizinho e Lucas; às primas lindinhas Bia, Olívia, Laura, Duda e Manu; ao João e à Vallentina que ficarão para sempre em meu coração; às tias Maricy, Odete, Elciette, Elza, Otília e Ruth; ao tio Edson e ao Gustavo, meu primo querido; à dindinha Julia, que sempre é tão carinhosa comigo e ao meu padrinho Graciano; ao Radetic e à Therezinha que sempre torcem por mim; às queridas Margot, Fátima, Daiane e Hildeni que sempre cuidaram e ainda cuidam da nossa família com tanto carinho.

Queria expressar minha eterna gratidão pelos meus avós. À vó Zezé, que é sempre tão animada, alegre e divertida; ao vó Murillo, que foi um ótimo avô e sempre nos incentivou a viver cada momento ao máximo; à vó Salette, que é um exemplo de força e que sempre me cobre de carinho. Tenho gratidão especial por ter tido a oportunidade de compartilhar o resultado da defesa dessa tese no Rio de Janeiro com meu vô Menezes. Aos 94 anos, ele me emocionou muito por ter passado o dia 30 de março de 2015 torcendo por mim da casa dele. Quando liguei para ele contando que tinha dado tudo certo, tive a grata surpresa de ouví-lo muito lúcido e orgulhoso dizendo que a próxima etapa seria a defesa na Holanda. Infelizmente, não poderei ligar para ele para contar o resultado dessa segunda defesa. Mas certamente vou lembrar dele com muito carinho nesse e em muitos outros momentos importantes da minha vida que ainda estão por vir.

Agradeço ao Diogo pela inestimável parceria ao longos dos últimos três anos e

à família dele que também passou a ser minha. Sempre serei grata à Célia, ao Paulo, à

Edir, ao Nelson, à Eliette, à Kátia, à Bia, ao Rodrigo, à Karina, ao Thiago, à Mimi, à

Gigi, ao Lukas, ao Bruno, ao Brian, ao Oliver e também ao Willy. Não poderia deixar

de dizer que sem o Diogo, a minha vida e essa tese não seriam as mesmas. Diogo

abriu portas para que eu fizesse trabalho de campo na Cidade de Deus e rapidamente

se tornou um ótimo companheiro de trabalho de campo. Além disso, quando nos

afastamos do campo para produzir nossas teses, ele tornou-se um excelente parceiro

de escrita. Muitas das ideias presentes nesse trabalho foram desenvolvidas a partir de

conversas que tivemos em St. Louis, em Amsterdam, em Paris e no Rio. Tenho

certeza que a nossa história não acaba com o fim de nossas teses.

(20)

Por fim, queria dedicar essa trabalho aos meus pais, Alfredo e Cyrene, por

sempre me incentivarem, me darem apoio em todos os sentidos e toda a liberdade do

mundo. Minha mãe é a pessoa mais carinhosa, sensível e doce que já conheci. Desde

pequena, ela sempre me incentivou a escrever, fotografar, criar e acreditar nos meus

sonhos. Meu pai, com seu jeito alegre, brincalhão e extrovertido, sempre nos ensinou

o valor do trabalho, dos estudos, sem deixar de repetir a cada encontro que “o

importante na vida é ser feliz”. Queria agradecer ainda aos meus pais pelo maior

presente que eles me deram na vida: Yanne, minha irmã, amiga que tanto amo e

admiro. Agradeço à Yanne por tudo que em ensina todos os dias, por toda paciência,

por todo o companheirismo, por me entender e me aceitar como eu sou. Tenho muito

orgulho da nossa família e essa tese, sem duvida, é resultado de todo o investimento

intelectual e emocional que, nas últimas três décadas, fizemos juntos.

(21)
(22)

    INTRODUÇÃO

1. “Entrando em um grande túnel escuro”

Bom, eu vou ser breve, mas vou contar um pouquinho da história. Em novembro de 2008 chegou um aparato policial muito grande aqui no Santa Marta. Nós achávamos que era uma incursão (...). Aí eu fui procurar saber o que estava acontecendo. Como presidente da associação, o pessoal vinha me procurar. O secretário falou assim: “não, Zé Mário, isso aqui não é uma incursão, não. Isso aqui foi a chegada da polícia para nunca mais sair daqui do Santa Marta.” Aí eu cheguei para o governador e falei: “governador, isso não é politicagem para a comunidade não, né?” Porque nós já tínhamos sofrido em 1999 com o Bope uma ocupação também. Duraram nove meses na comunidade e quando o Bope saiu do morro não falou nada para ninguém. Saiu saindo, a comunidade ficou à mercê de invasões, pessoas morreram, pessoas perderam casas. (Trecho de um discurso de Zé Mário Hilário, presidente da Associação de Moradores do Santa Marta1) Quando a UPP chegou, eu me lembro! Foi a maior correria! Nós não sabíamos, não estávamos programados. Estávamos dormindo em casa com fuzil. Perdemos amigos para caramba. Morreram uns 9 nesse dia (…). Nós estávamos acostumados com a favela tranquila. Sempre amanhecia arregadona. Então, nós chegávamos, deitava na cama, deixava o fuzil de um lado, pistola do outro, e ia dormir. Acordava, tomava banho, escovava o dente, botava o fuzil do lado, ligava a moto e saía para começar a colocar a boca para funcionar. Quando eu fui fazer isso, vi o Caveirão e falei: “ih, caralho”! Já desliguei a moto, fui pelo cantinho da parede, entrei em casa de novo e já acordei meus parceiros e falei: “qual foi, mano? Os canas estão aqui na favela”. (...) Papo vai, papo vem, liga para um, liga para outro (…) e para tirar os negócios [armas e drogas] de dentro da casa?

Maior adrenalina doida, acordamos todo mundo. Moravam quatro moleques comigo: “vambora, vambora. Liga para fulana de tal, cicrana, mulher, prima, o que der para elas irem levando aos poucos”. Então, foi assim: UPP entrou, vários amigos dormindo, os canas invadiram, viram o fuzil do lado e nem esperou falar nada (…). No dia que a UPP chegou morreram uns 9 (…). A gente achava que era uma operação policial normal. (Trecho de entrevista com um traficante da Cidade de Deus) A gente não sabia o que estava acontecendo. O dia que teve a invasão, eu saí para trabalhar e vi vários policiais entrando. Eu pensei que fosse uma incursão, uma blitz, só. Mas depois eu soube que foi na Cidade de Deus toda. Via muitos carros do Bope, mas ninguém tinha ideia. [...]. Tanto que os caras [envolvidos com a venda de drogas na favela] acreditavam que eles [os policiais] não iam ficar. (...) Os caras só levaram fé naquilo ali quase um mês depois. Os caras viram que não tinha mais jeito, que ela ia ficar definitivamente. Ali eles acordaram... Mas no início, nem os policiais sabiam, nem os caras da milícia sabiam. (Trecho de entrevista com morador da Cidade de Deus)

                                                                                                               

1 Trecho do discurso feito por Zé Mário durante a inauguração do Projeto Rio Top Tour, realizada no dia 30 de agosto de 2010 na Quadra da Escola de Samba Mocidade Unida do Santa Marta.

(23)

Em novembro de 2008, quando a Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro ocupou a Cidade de Deus e o Morro Santa Marta, lideranças comunitárias, moradores e jovens que atuam (ou atuavam) no comércio varejista de drogas ilegais pensaram estar diante de apenas mais uma “operação policial normal”. A ação da polícia nesses territórios, a princípio, parecia seguir o mesmo roteiro das incursões que há algumas décadas vinham reiteradamente ocorrendo nas favelas cariocas.

Como de costume, policiais fortemente armados entraram nas duas favelas contando com o fator surpresa e encontraram a resistência de traficantes. Trocaram tiros – seguidos de mortes no caso da Cidade de Deus –, efetuaram prisões em flagrante e apreenderam drogas e armas. Apenas o último elemento do roteiro “padrão”

das operações policiais de praxe nas favelas não fez parte da ação realizada em novembro de 2008: dessa vez a polícia não se retirou dos territórios alguns dias após o início da incursão.

Em um primeiro momento, ninguém entendeu muito bem o sentido da polícia permanecer na favela. Os repertórios habituais de que dispunham os moradores dessas localidades não auxiliavam nesse trabalho interpretativo. Não havia informações oficiais disponíveis sobre o que estava ocorrendo ou iria ocorrer. Inicialmente, não houve qualquer anúncio de que seriam inauguradas no Santa Marta e na Cidade de Deus as duas primeiras Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) da cidade do Rio de Janeiro – até porque, nesse momento, o nome UPP ainda nem sequer existia.

Logo, ninguém podia antecipar que naquele momento começava a ser elaborado e testado um projeto que ganharia centralidade no debate sobre segurança pública no Brasil. Era impossível – até mesmo para os policiais ou funcionários mais otimistas do governo – prever que se tratava do início, nessas duas favelas, de uma experiência que, posteriormente, seria classificada como se não a mais, certamente uma das mais significativas em termos de segurança pública produzidas no Rio de Janeiro nas últimas décadas. Como sintetizou o presidente da Associação de Moradores do Santa Marta, no momento que o morro foi ocupado, a sensação de grande parte da população da favela era a de estar “entrando num grande túnel escuro, esperando chegar rapidamente do outro lado para ver muita luz”

2

.

                                                                                                               

2 Trecho de depoimento “Aprendendo com os erros”, dado por Zé Mário e publicado no jornal Extra, em 28 de dezembro de 2008.

(24)

É possível dizer, portanto, que, em novembro de 2008, os moradores do Santa Marta e da Cidade de Deus viveram plenamente o que o filósofo pragmatista John Dewey definiu certa vez como uma situação indeterminada, ou seja, uma situação

“incômoda, problemática, ambígua, confusa, cheia de tendências conflitivas, obscura, etc.”, uma situação na qual aqueles que estavam nela envolvidos a vivenciam como

“incerta porque a situação era inerentemente incerta” (1938, p.171).

Moradores e traficantes que atuavam nesses territórios não sabiam ao certo por que a polícia tinha ocupado a favela em que residiam e até quando o contingente policial ali permaneceria, muito menos como permaneceriam. Diante dessa situação confusa e permeada de ambiguidades, diversos atores começaram a indagar a respeito do que estava ocorrendo, mobilizando assim suas capacidades e competências reflexivas com a finalidade de tornar inteligível aquela indeterminação.

Em um dos relatos citados, que servem de epígrafe à introdução, o presidente da Associação de Moradores do Santa Marta descreve com riqueza de detalhes essa experiência do trato com a nova indeterminação e narra como muitas pessoas o procuraram para perguntar o que estava se passando na favela. Incapaz de dar uma resposta, ele conta como procurou outros presidentes de associações de outras favelas da Zona Sul para conversar e se reunir com o poder público, exigindo uma explicação sobre o que estava acontecendo.

Os jovens envolvidos com o comércio varejista de drogas nessas duas favelas também começaram a se perguntar e a tentar entender o que estava ocorrendo.

Acionaram os contatos que tinham e quando notaram que não estavam diante de uma

“operação policial normal”, não sabiam ao certo como agir. Por isso, tiveram que

improvisar. Ter informação, qualquer informação que fosse, naquele momento, era

essencial para que pudessem traçar estratégias minimamente seguras de ação. O que

fazer diante daquilo que não sabiam direito o que era? Como agir diante daquilo que

não se sabe bem ao certo o que é? Mesmo não sabendo nada a respeito do modo como

a polícia iria atuar na favela durante a ocupação, bastou a informação de que a partir

de agora a polícia ficaria na favela para que os traficantes improvisassem uma

estratégia de ação. Ainda que de modo precário e permeado de riscos, alguns

resolveram se esconder, outros (sobretudo aqueles de alta hierarquia) decidiram

escapar e fugir temporariamente para outras favelas não ocupadas pela polícia e,

(25)

portanto, mais seguras para eles

3

. Só alguns poucos traficantes de áreas específicas, como o Karatê na Cidade de Deus, resolveram enfrentar diretamente a polícia em meio à situação indeterminada.

Nesta tese analiso a chegada da polícia no Santa Marta e na Cidade de Deus como uma crise ou momento crítico, ou seja, um evento capaz de produzir uma ruptura com as formas habituais de ação, quebrando com as expectativas que os atores possuem acerca de sua maneira rotineira de ser, de se comportar e de agir. Como explica Shibutani (1966):

a crisis is any situation in which the previously established social machinery breaks down, a point at which some kind of readjustment is required. Crises are often provoked by environmental changes. (...) A crisis is a crisis precisely because men cannot act effectively together. When previously accepted norms prove inadequated as guides of conducts, a situation becomes problematic, and some kind of emergency action is required (1966, p.172).

Em poucas palavras, analiso na presente tese a ocupação policial que promoveu o surgimento das UPP como uma desrotinização momentânea da vida cotidiana da favela. Busco compreender como tal processo modificou e transformou os modos de existência ou formas de vida locais, fazendo com que boa parte do que era tomado como óbvio (taken for granted) pelos moradores e pelos traficantes deixasse de sê-lo de maneira repentina. A UPP, nesse sentido, mais do que um

“experimento de desestabilização” (breaching experiment, Garfinkel, 1963), foi uma experiência de desestabilização. Isto porque todos os atores afetados com sua chegada foram obrigados a forjar novos repertórios sensíveis e cognitivos para lidar com a nova situação. No entanto, antes de analisar essas mudanças geradas pela chegada das primeiras UPPs, descreverei brevemente como se configuravam as rotinas nas favelas cariocas nas últimas décadas, pois se o processo de “pacificação” trouxe novidades, convém desenvolver o que havia antes de sua chegada.

2. As rotinas, os tiroteios e a “leitura do clima” das favelas

A percepção e a vivência da violência urbana

4

na vida cotidiana talvez seja um dos mais importantes fenômenos sociais deste início de século (BURGOS, 2008). Na                                                                                                                

3 Beltrame afirma que, no caso do Santa Marta, a polícia recebeu informações de que traficantes “se desarmaram, vestiram uma roupa melhor, lavaram bem as mãos – a polícia tem um spray que detecta pólvora – e desceram caminhando tranquilamente” (2014, p.108).

(26)

América Latina, tal fenômeno chama especial atenção, pois a região concentra os mais altos níveis de violência urbana do mundo (KOENDERS; KOONINGS, 2012, p.

1)

5

. No Brasil, não são poucos os autores (ADORNO, 2002; ZALUAR; ALVITO, 2004; MISSE, 2006; MACHADO DA SILVA, 2008) que vêm estudando este fenômeno e apontando que a violência tem sido percebida, com crescente intensidade nos grandes centros urbanos. No Rio de Janeiro, especialmente, inúmeras pesquisas indicam que a quantidade de crimes violentos praticados cresceu significativamente a partir dos anos 1980.

Misse (2011) aponta que a taxa de roubos com violência registrada pela polícia no Rio de Janeiro passou de 263 por 100 mil habitantes em 1980 para 830 por 100 mil habitantes em 2009. As taxas de homicídio também aumentaram significativamente passando de dez por 100 mil na década de 1950 para 25 por 100 mil na década de 1970 e alcançaram 50 por 100 mil habitantes nos anos 1980. Entre 1980 e 2007, aproximadamente 200 mil pessoas foram assassinadas só no estado do Rio. E, como aponta o autor, há “um consenso entre os especialistas de que parte significativa desse aumento relaciona-se ao tráfico de drogas a varejo em favelas e outras áreas urbanas de baixa renda” (MISSE, 2011, p.14).

A expansão da violência urbana no Rio de Janeiro parece estar umbilicalmente ligada à economia internacional da droga, em particular da cocaína, que se juntou a já                                                                                                                                                                                                                                                                                                                              

4 Neste trabalho sigo a perspectiva proposta por Machado da Silva (2008, p. 35) de pensar a violência urbana como uma representação coletiva, ou mais especificamente, uma representação de práticas – ameaças de saque à propriedade privada e à integridade física – e de modelos de conduta

subjetivamente justificados. Assim como Machado da Silva, partirei da ideia de que a violência urbana é uma construção simbólica que “constitui o que descreve”. Isto é, “uma categoria do entendimento do senso comum que consolida e confere sentido à experiência vivida nas cidades”. Tal categoria orienta instrumental e moralmente os cursos de ação que os moradores das cidades – como indivíduos isolados ou em ações coletivas – consideram mais conveniente nas diversas situações em que atuam.

5 A violência urbana na América Latina tem provocado um debate teórico intenso. Pereira e Davis (2000), Koonings (2001) e Briceno-Leon e Zubillaga (2002) vêm caracterizando as atuais

manifestações de violência em diversas cidades latino-americanas como uma “nova” violência, que já não é mais causada por regimes autoritários e guerras civis. Segundo os atores, o que caracterizaria essa violência “nova” é que ela tem lugar em sociedades democráticas, onde há estados consolidados e que estão politicamente “em paz” e já não envolveria mais a disputa de poder politico ou de posições ideológicas, centradas no Estado. Os autores acrescentam que a violência contemporânea latino- americana é perpetrada por uma escala muito mais ampla de atores violentos que possuem interesses diversos (KOONINGS; KRUIJT 2004, p. 8). Diferentes enfoques analíticos vêm enquadrando essa violência como um problema de governança, um problema de unrule of law ou ainda um problema ligado ao surgimento de poderes paralelos formado por atores armados que passam a disputar território e poder. Alguns trabalhos como o de Arias (2006) vêm criticando, contudo, essa noção de poderes paralelos argumentando que os atores armados que controlam territórios urbanos atualmente não podem ser entendidos de modo isolado, uma vez que eles mantêm múltiplas ligações com o Estado, com atores estatais e a política “legal”.

(27)

existente cadeia produtiva da maconha. A histórica segregação espacial das favelas favoreceu que essa ponta do tráfico internacional, relacionada ao comércio de drogas a varejo, tivesse um de seus principais canais concentrado nesses “territórios da pobreza” (MACHADO DA SILVA, 2010). Assim, as favelas cariocas tornaram-se uma espécie de base de operações do crime violento relacionado ao comércio de drogas ilícitas.

Desde o seu surgimento, há mais de um século (VALLADARES, 2005;

ZALUAR; ALVITO, 2004), as favelas sempre foram vistas como uma espécie de quisto que ameaçava a organização social da cidade (MACHADO DA SILVA, 2002).

No entanto, os atributos que compõem o conteúdo do que é definido como “o problema favela” modificaram-se significativamente a partir dos anos 1980. A

“violência urbana” alterou o lugar das favelas no imaginário da cidade (MACHADO DA SILVA, 2008). Com a expansão do tráfico de drogas, o aumento dos confrontos armados entre diferentes facções criminosas e os conflitos entre esses grupos criminosos e a polícia, houve uma superposição do “problema da segurança” com o

“problema das favelas”.

Como lembra Misse, as principais organizações criminosas do tráfico a varejo no Rio de Janeiro – que surgiram dentro do sistema penitenciário durante a ditadura militar – estabeleceram-se nos morros cariocas e passaram a disputar esses territórios.

Essa disputa levou a uma intensa “corrida armamentista” entre comandos:

A expectativa do Comando Vermelho era a de oligopolizar o mercado a varejo das drogas em todo o estado do Rio de Janeiro, mas ainda em meados dos anos 1980 surgiu outra organização, intitulada “Terceiro Comando” (TC), que passou a disputar violentamente os territórios com o CV. Iniciou-se, assim, uma corrida armamentista entre os dois comandos pela posse das armas mais eficientes e letais, capazes de garantir seja a manutenção do controle dos pontos de venda, seja sua expansão para outras favelas. Com isso, estruturou-se, em paralelo, o tráfico de armas de guerra (fuzis AK-47, AR-15, metralhadoras de uso reservado das Forças Armadas, granadas, armas antiaéreas, bazucas etc.). Havia também os traficantes que controlavam áreas que se consideravam “independentes”

dos dois comandos. Com o tempo, dissidências surgiram e criaram-se novas facções a partir de meados dos anos 1990 (Comando Vermelho Jovem (CVJ), Amigos dos Amigos (ADA) e Terceiro Comando Puro (TCP), elevando a disputa com o Comando Vermelho (CV) a níveis de violência inéditos na cidade). (2011, p. 19).

Misse lembra ainda que a reprodução dessas organizações criminosas foi

particularmente dependente de acordos e trocas políticas com agentes públicos, dos

(28)

quais policiais – que detêm o uso legal das armas e de informações estratégicas – constituiriam um dos principais tipos. Como aponta o autor:

diferentemente do jogo do bicho, que pratica o “arreglo” (acordo negociado) ou mesmo a cooptação de agentes públicos para sua folha de pagamento, policiais do Rio passaram a praticar o “arrego” (extorsão) sobre os traficantes de drogas, impondo trocas políticas assimétricas e praticamente compulsórias. (...) Sem essas mercadorias políticas, torna-se difícil compreender as relações entre violência, organizações criminosas e lucros nos mercados ilegais brasileiros” (2011, p. 23).

Como as organizações criminosas se estabeleceram nas favelas cariocas e ali se expandiram, esses territórios passaram a ser vistos “como o valhacouto de criminosos que interrompem, real ou potencialmente, as rotinas que constituem a vida ordinária na cidade” (MACHADO DA SILVA, 2010, p. 297). E as favelas deixaram, consequentemente, de ser tematizadas na “linguagem dos direitos” e passaram a ser processadas na “linguagem da violência urbana”. Ocorreu, assim, como sugere Machado da Silva,

a simplificação e o reducionismo de uma linguagem que restringe o tratamento dos problemas (no caso, a manutenção da ordem pública) a uma guerra contra atividades que perturbam o prosseguimento rotineiro da vida social. E que atribui a culpa a um segmento – os moradores dos territórios da pobreza e, mais especificamente, os favelados –, o qual, a partir de sua criminalização, torna-se o tipo ideal do Outro que precisa ser afastado a qualquer preço. Em decorrência, convergem para os aparelhos policiais demandas de recomposição de uma ordem social tida como ameaçada.

Cresce o clamor por uma ação “dura” – isto é, ilegal –, de modo que a única possibilidade de evitar a contaminação moral de todo o sistema, preservando os aspectos institucionalizados do conflito social, é deixar a

“dureza” da repressão ao arbítrio da polícia. (2010, p. 293).

Dessa forma, a ação policial “dura” passou a dirigir-se não tanto a grupos sociais específicos e mais ao controle e segregação territorial de áreas urbanas tidas como perigosas. Assim, como afirma Machado da Silva, fechou-se “o círculo de ferro que redesenha o espaço da cidade, na formulação dominante, a partir da relação entre violência urbana e ‘sociabilidade violenta’”

6

. E, em seu novo desenho, o Rio passou a                                                                                                                

6 Machado da Silva define “sociabilidade violenta” como uma forma de vida singular na qual “a força física, com ou sem instrumentos e tecnologias que a potencializam, deixa de ser um meio de ação regulado por fins que se deseja atingir, para se transformar em um princípio de coordenação (um

‘regime de ação’) das práticas. Em outras palavras, no limite, a violência se libera da regulação simbólica, isto é, de sua subordinação às restrições e condicionamentos representados pelos fins materiais ou ideais a que, sob outras circunstâncias, serviria como meio para sua obtenção. Ela se torna um fim em si mesma, inseparável de sua função instrumental como recurso para a ação. Em suma, como, aliás, sugere o próprio sentido do termo “princípio”, ela é sua própria explicação e se autorregula. (...) Ao menos no Rio de Janeiro, os ‘portadores’ da ‘sociabilidade violenta’ são,

(29)

ser representado como uma “cidade partida” (VENTURA, 1994) na qual, de um lado, estão os bandos ligados ao varejo fixo de drogas, situados nas áreas de favela. Do lado oposto estão os cidadãos

7

e as organizações policiais impondo (por delegação

8

dos

“cidadãos de bem”) a redefinição das favelas como “complexos” territoriais a serem militarmente combatidos e confinados (MACHADO DA SILVA, 2010, p. 298).

Configurou-se, assim, especialmente, a partir dos anos 1990, a representação do conflito social no Rio de Janeiro como uma guerra (LEITE, 2012), cujo mecanismo central passou a ser as chamadas operações policiais realizadas em favelas

“dominadas” por traficantes de drogas. Diante do caráter sedentário das empresas locais do varejo de drogas, as políticas estaduais de segurança pública, como apontam Misse, Grillo, Teixeira e Neri (2013), tenderam a centralizar sua estratégia no enfrentamento pontual ao tráfico, visando efetuar, com regularidade variável, prisões e apreensões de armas, dinheiro e material entorpecente. Mesmo quando conduzidas investigações baseadas em informantes e escutas telefônicas, são necessárias as operações policiais de incursão em favelas para a execução dos mandados de busca e apreensão. E quando essas operações têm início e a polícia entra no território da favela, quase inevitavelmente, ocorrem confrontos entre policiais e traficantes.

Os confrontos entre policiais e traficantes geram frequentemente como

“efeitos colaterais” mortes nem sempre acidentais. Isso porque, nesse tipo de ação policial, o extermínio acabou tornando-se uma das estratégias para a vitória do inimigo, já que “com facilidade” é “admitido que situações excepcionais – de guerra –

“exigiam “medidas também excepcionais e estranhas à normalidade institucional e democrática” (LEITE, 2012, p.379). É possível dizer, portanto, que, “a polícia passou a adotar cada vez mais uma política de extermínio” (MISSE, 2011), na qual a morte                                                                                                                                                                                                                                                                                                                              

tipicamente (mas não exclusivamente), os bandos de traficantes responsáveis pelo funcionamento das

‘bocas’ tendencialmente localizadas nos ‘territórios da pobreza’” (2011, p. 286)

7 Como aponta Leite (2012, p. 379), geralmente, são considerados cidadãos, nesse contexto, aqueles que são “trabalhadores, eleitores e contribuintes e, nesta qualidade, pessoas de bem, honradas, para quem a segurança é condição primordial para viver, produzir, consumir”.

8 Leite indica que a operacionalização da promoção da “guerra” contra as favelas “envolve uma modelação do mandato policial nesses territórios, que libera os agentes do Estado para irem além da

‘força comedida’ que é sua atribuição constitucional, ou seja, para a utilização da ‘força desmedida’

(Brodeur, 2004). Este dispositivo atribui ao agente policial “na ponta” a prerrogativa de decidir quando, como e contra quem agir de forma extralegal, em um movimento discricionário que não se submete à lei, ou melhor, que embaralha o legal e o ilegal, o legítimo e o ilegítimo (Telles, 2010), e que é dependente das avaliações e julgamentos individuais do agente, fortemente influenciado pelo

contexto da ação e, neste sentido, pelos preconceitos associados à estigmatização das favelas e de seus moradores” (2012, p. 380).

(30)

de traficantes por policiais durante operações realizadas em favelas é não só tolerada, mas também desejada e premiada

9

.

A partir de toda essa configuração, a rotina das favelas cariocas, nas últimas décadas, passou a constituir-se sobretudo, pela virtualidade de conflitos violentos que pode irromper a qualquer momento nesses territórios. As manifestações violentas que ameaçam a rotina da parcela da população que vive em favelas resultam da contiguidade territorial inescapável com os bandos armados ligados ao comércio de drogas ilegais e com a atuação pouco previsível e quase sempre violenta da polícia e das milícias

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. A proximidade entre esses atores provoca entre as populações que não moram em favelas uma grande desconfiança em relação aos “favelados”.

Viver em tais circunstâncias gera o que Machado da Silva e Leite (2008) chamam de “vida sob cerco”, isto é, uma experiência de confinamento socioterritorial e político que provoca nos moradores de favelas uma intensa preocupação com manifestações violentas que impediam o prosseguimento de suas rotinas diárias e dificultavam a manifestação pública de suas demandas. Tal experiência é produzida por uma série de “eventos fora de controle, em graus e intensidade muito maiores do que aquela que atinge o conjunto da população da cidade, igualmente assoberbada por episódios violentos que se repetiam sem cessar” (MACHADO DA SILVA; LEITE;

2008, p. 35). E um dos eventos pouco previsíveis que mais desestabiliza a rotina da população carioca, de um modo geral, e a dos moradores de favelas, em especial, são os tiroteios.

                                                                                                               

9 Entre 1995 e 2000, os policiais militares e civis do Estado do Rio de Janeiro que praticassem atos considerados de bravura pelo comando da corporação − que resultavam, recorrentemente, na morte de supostos criminosos – foram premiados com a chamada “gratificação faroeste”. Criado em novembro de 1995 pelo general Nilton Cerqueira, secretário de segurança no governo do Rio de Janeiro de Marcello Alencar, o encargo especial estimulou confrontos e mortes e só foi suspenso no ano 2000.

10 Na última década, as milícias ganharam uma grande notoriedade no debate sobre segurança pública na cidade do Rio de Janeiro. Embora não seja possível precisar exatamente quando e como o fenômeno teve origem, Cano e Duarte (2012) sugerem que o termo milícia foi cunhado, por volta de 2006, para descrever grupos de agentes armados do Estado (policiais, bombeiros e agentes penitenciários) que controlavam favelas e loteamentos e tinham o controle monopolístico sobre diversas atividades econômicas exercidas nestes territórios. Algumas dessas atividades são a venda de gás, o transporte alternativo e o serviço clandestino de TV a cabo e de Internet. A partir do domínio territorial armado de certos territórios da cidade, esses grupos, além de vender os serviços listados acima, também vendiam

“proteção” em troca de taxas que comerciantes e residentes eram obrigados a pagar mensalmente.

Quem ousava não pagar essas taxas era duramente coagido (podendo apanhar, ser expulso da favela ou até morrer). Essa atuação da milícia, até pouco tempo atrás, era legitimada pelo discurso de que os milicianos estariam libertando os moradores dos traficantes de drogas e estariam instaurando uma ordem protetora nos territórios antes dominados pelo tráfico. E mesmo nos territórios onde antes não havia uma forte presença do tráfico no passado, a atuação da milícia era apresentada como uma forma legítima de prevenção que impedia que traficantes viessem a dominar o território futuramente.

Referenties

GERELATEERDE DOCUMENTEN

a) alguns rumores transformaram-se em verdades, após serem verificados pelo público ou confirmados oficialmente (tanto pela mídia, como por fontes oficiais do

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